Lembro desta cena: final do dia, e eu acabara de chegar à cabana que me abrigaria entre os arrozais em Sapa, região ao norte do Vietnã. Sentei-me frente a uma mesa de madeira, circulada por um casal de alemães e um jovem britânico, que dividiam comigo uma cerveja e a experiência de home stay, estadia em casa de família. Enquanto jogávamos conversa fora, eu observava os cachorros que transitavam livremente do pátio para a cozinha e que, volta e meia, deitavam-se nos colchões depositados no chão, que, logo mais, fariam as vezes de cama. Foi quando um dos nossos anfitriões largou lá do fogão, revezando de uma panela à outra: e Foz do Iguaçu, que tal? “Lindo!”, respondi surpresa com a sugestão de destino inesperado, cuidando para não incentivar o assunto, na ansiedade de que meus parceiros de aventura desvendassem que eu, uma brasileira mochileira do mundo, a cerca de 18 mil quilômetros de casa, nunca havia encontrado as cataratas, originalmente, a 900 quilômetros de Porto Alegre, lugar em que vivo.
Ao longo da minha volta ao mundo, descobri que, de fato, o Brasil já havia sido descoberto para muito além do Rio de Janeiro. Respondi curiosidades sobre Bonito, Manaus e Inhotim entoados em diversos sotaques e cada vez me encolhendo mais no constrangimento de conhecer tanto de fora e tão pouco de dentro (dos 27 estados, circulei por 14). Ainda antes de retornar, prometi: minha primeira parada obrigatória ao chegar, assim que pendurasse novamente a mochila nas costas, seria na Amazônia. Que vergonha senti ao perceber a prioridade em desbravar o deserto dos outros antes das próprias florestas.
Cá entre nós: nossas escolhas são reflexos do que somos. Espiar o mundo pela janelinha do avião sempre terá maior conexão com os sonhos do que encarar um pouso tumultuado engatado à burocracia de um aeroporto antes de encontrar o destino - por mais almejado que seja. Viajar para dentro é não ir embora. É analisar, avaliar e permanecer. Não há rota de fuga prevista quando decidimos entender o que é nosso. Viajar para dentro é tornar o que parecia conhecido, íntimo. É permear a lenda, desbravar as origens, entender os buracos do trajeto e compreender do que o solo é produzido. A gente titubeia. Afinal, tão mais confortável olhar para o mapa do vizinho e, se não for do gosto, garrar a estrada assim que possível.
Então, quais as vantagens? Ah, são diversas e irreversíveis. Ao desbravar a parte interna, reforçamos o pertencimento (que, aliás, está escasso). Apropriamo-nos dos nossos encantos e blindamos as mazelas. Aquele velho clichê da delícia e dor de ser o que se é. Cada um sabe das suas. Encontramos beleza no imperfeito e sutilezas no imponente. E o melhor: aprendemos a lidar e se apoderar do que é histórico e cultural. Escrevo aqui sobre viajar pelo nosso país, mas serve também como um convite para uma imersão pessoal, de autoconhecimento. Afinal, estamos em setembro, o mês da conscientização de que estar familiarizado com o que corre na mente e na alma é vital.